Quadros em sílabas
Há algumas palavras que realmente me fascinam. Não só pelo aspecto pequenino do sentido, essa coisa batida de Acho linda a palavra saudade, porque só existe em português. Nada disso.
Essas tais palavras são um punhado de sílabas que me agradam, porque parecem aquela gota resfolegante de sorvete que cai na sua mão, verão correndo solto, para logo ser lambida. Perdoem o clichê do exemplo, mas foi o que me ocorreu. Long story short, gosto das palavras porque elas me parecem bonitas como um quadro. Olho e digo, sucinto, Que bonita.
Escolhi, até hoje, só duas (é bem verdade que não tenho muito mérito em nenhuma delas. Ambas foram quase indicações, embora eu goste de pensar que tive algo a ver com a palpitação desajeitada com que a idéia da palavra saiu. Mas admito. Trata-se, aparentemente, de um roubo amigo).
A primeira, que coisa linda: 'perhaps'. O som, a escrita, a combinação, os diversos tons que a acolhem. Ela pode ser dita rápida ou devagar. Em sílabas. Acentuando o 's' no final ou equilibrando uma pausa, no dedo indicador, no 'r'. Se ainda não significasse talvez, se significasse "mesa": ainda assim seria bonita.
A outra é 'endlich'. Provavelmente a única palavra com algum significado não comercial que eu conheço do alemão. A mim, a palavra me socorre quase um tapa com luva de algodão, uma provocação algo cínica, algo sarcástica. A palavra, antes de saber seu significado, já me parecia definitiva. Ainda fiquei mais surpreso quando soube que era, na verdade, um advérbio. E de modo: 'finalmente'. A dicção do 'ch' é como um 'r' cuspido, um 'r' e um 's' sequenciais. Veja se não traduz uma afronta. Definitiva. Coisa de vida ou morte.
"Endlich, perhaps." - poderia, com honestidade, ser o lema de alguma campanha hedonista.
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